6 de out. de 2011

Iochpe-Maxion

          Foi com a ajuda da Jewish Colonization Association, entidade criada para facilitar a emigração de judeus do Leste Europeu, que Gregorio Ioschpe foi parar numa colônia agrícola na Argentina, em 1909. Três anos depois, estava no Rio Grande do Sul, onde construiu uma serraria.
          Por conta de confusões que costumam ocorrer nos cartórios, principalmente com quem vem de terras com alfabeto diferente do nosso, uma parte da família Ioschpe ficou sem o "s" no sobrenome. E foi justamente o irmão que não tinha a letra no sobrenome quem fez o registro da empresa - Iochpe. Daí a diferença.      
          A longa história empresarial da Iochpe iniciou em 1918, passou por setores diversos, como o madeireiro (a família dedicou-se à comercialização de madeira por quase 40 anos) e o financeiro, até ganhar foco no ramo industrial.
          A diversificação dos negócios começou na década de 1950. Envolveu de agricultura e celulose até banco de investimentos. A vocação industrial surgiu com a aquisição do controle da fabricante de motores Massey Perkins, em 1983, e de uma fábrica de vagões, pouco depois. Nessa época, o nome Maxion foi incorporado. Mestre na arte de fixar marcas na cabeça dos consumidores, é do consultor americano Al Ries o nome Maxion.
          A Iochpe era comandada por seu principal acionista, o empresário gaúcho Ivoncy Brochmann Ioschpe, filho de Gregorio.
          Em 1984, o grupo Iochpe abriu o capital na Bovespa. A Iochpe-Maxion tem o ticker MYPK3.
          Na década de 1990, a companhia escolheu o setor de autopeças e de equipamentos ferroviários como nicho, comprando participações em empresas que a levariam a destaque mundial.
          A entrada no segmento de rodas ocorreu em 1992, quando a Iochpe comprou da Fumagalli uma linha de produção de rodas sem câmaras, uma novidade à época - para caminhões, tratores e ônibus. A linha, semi-nova, proporcionou a produção de cerca de 30 mil rodas por mês, consolidando a empresa como um importante player do setor.
          Em 1994, como parte de um processo de reestruturação e unificação das operações a holding Companhia Iochpe passa a denominar-se Iochpe-Maxion, incorporando a marca forte criada pelo Grupo ligada ao setor de autopeças. No mesmo ano a Iochpe-Maxion adquire planta em Contagem (MG) da Eluma Autopeças, diversificando sua produção de componentes automotivos e alcançando a liderança de mercado com vários de seus produtos.
          Em outubro de 1995, o grupo passou adiante uma participação de 29,2% no capital da Riocell, fabricante de celulose gaúcho. Dois meses depois, veio a venda de sua parte (47%) na Edisa, uma joint venture no ramo de informática com a Hewlett-Packard, arrematada por 22 milhões de dólares pelo sócio americano. O dinheiro obtido nas duas operações acabou sendo utilizado para saldar parte das dívidas de curto prazo com os banqueiros. Mas não foi suficiente. A necessidade de obter mais recursos para reduzir as dívidas acabou precipitando a venda da até então intocável divisão de máquinas agrícolas, um de seus core business.
          No início de maio de 1996, Ivancy Ioschpe deixa o negócio de tratores e colheitadeiras, que foi vendido ao grupo americano AGCO por 260 milhões de dólares. Entregou, portanto, a marca Massey Ferguson, a mais conhecida do país nesse mercado. Os motivos para tal decisão eram fáceis de entender. Em 1995, a Iochpe-Maxion, líder do mercado de máquinas agrícolas e uma das maiores do ramo de autopeças, colheu um prejuízo de 109 milhões de dólares. As dívidas cresceram. Em dezembro de 1995, o endividamento líquido do grupo atingia 366 milhões de dólares. Em meados de 1996, estava em 430 milhões, dos quais quase a metade no curto prazo.
          A venda da divisão, que representava 60% das receitas do grupo, foi, portanto, uma medida para aliviar o caixa e voltar a respirar.
          A parte curiosa dessa história fica por conta do comprador: a AGCO Corporation é nada menos do que a atual controladora da Massey Ferguson, a mesmíssima empresa canadense de quem Ivoncy comprara a fábrica de tratores, em 1982. À época, a Iochpe pagou cerca de 6 milhões de dólares por 33% de participação na Massey brasileira. Os canadenses e os bancos internacionais credores ficaram com o restante das ações. Em 1990, a Iochpe, que aos pouco fora adquirindo as participações dos bancos, assumiu a fatia da Massey, desembolsando mais 45 milhões de dólares.
          Com a compra, a AGCO, baseada em Duluth, arredores de Atlanta, na Geórgia, fica com duas plantas instaladas nas cidades gaúchas de Canoas e Santa Rosa. Herda também 1.400 funcionários, 45% do mercado brasileiro de tratores agrícolas e 20% do de colheitadeiras.
          No início de 1996, a Iochpe-Maxion associou-se ao Bradesco na Brosol. A empresa, sediada em Ribeirão Pires, no ABC paulista, produz sistemas de levantamento de vidros e fechaduras para automóveis.
          Transformada em fabricante de autopeças, a Iochpe-Maxion que passou a existir a partir do final de junho de 1996, quando a divisão de máquinas agrícolas foi transferida para a AGCO, ficou com no máximo 50% de seu tamanho antes da transação em termos de receitas. Dos 7.200 empregados, restaram 4.800.
          Em 1998, Ivoncy Ioschpe deixa o cargo de diretor-presidente que passa para seu filho Dan.
          No último trimestre de 1998, o grupo Iochpe associou-se à americana Navistar, que adquiriu 50% do capital de sua fábrica de motores, a Maxion Motores.
          Em 2009, a Iochpe-Maxion adquire a Fumagalli, tradicional fabricante de rodas brasileiro que pertencia ao Grupo ArvinMeritor, com unidades industriais na cidade de Limeira, no Brasil e San Luis Potosi, no México.
          Mas o salto expressivo ocorreu em outubro de 2011, quando a Iochpe anunciou duas grandes tacadas: a compra da norte-americana Hayes Lemmerz, tradicional fabricante de rodas de aço e alumínio, concretizada em 2012, por US$ 725 milhões; e o grupo mexicano Galaz, de peças para chassis, por US$ 195 milhões. Ao contrário da Iochpe, que tem diferentes linhas de negócio, a Hayes Lemmerz é fundamentalmente uma fabricante de rodas e a líder mundial do setor (com capacidade de produção anual estimada em 63,4 milhões de unidades) - título repassado à empresa brasileira. A compra desse ativo permitiria a entrada da Iochpe no mercado de rodas de alumínio - no momento da compra, ela produzia só peças de aço.
          Apesar de sediada em Michigan, nos Estados Unidos, a Hayes Lemmerz conta com 17 fábricas espalhadas por 11 países, dos quais cinco são europeus.
          Em 2012, Marcos de Oliveira estava prestes a se aposentar de uma longa carreira, de 28 anos, na Ford, seu primeiro e único empregador, até então, quando Dan Ioschpe o procurou. Bisneto de Gregório e atual presidente do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes (Sindipeças), Dan buscava um executivo para fazer uma transição na empresa que sempre teve a família que a fundou no comando e que ainda é acionista majoritária, com cerca de 16% das ações. Outro sócio importante é o BNDESPar.
          Dan foi o último da família na presidência executiva. Seu plano era ir para a presidência do conselho - vaga que ocupa hoje - assim que encontrasse um executivo capacitado para colocar em prática um ousado plano de expansão internacional. Impressionou-se com o currículo de Oliveira, que exibia vasta experiência internacional e em cargos de comando.
          Não faltam numa multinacional com atuação tão diversificada histórias curiosas. A fábrica que a Iochpe tem na Tailândia surgiu, em 2012, de uma associação com o rei Maha Vajiralongkorn - na época ele era príncipe. Há pouco tempo, porém, o monarca vendeu sua participação, de 30%. Hoje, a empresa brasileira detém 100% das ações da operação tailandesa.
          Oliveira começou na Iochpe em 2012 e assumiu a presidência em 2014. Desde então, segue o estilo discreto que sempre caracterizou a companhia. Mergulhou incansavelmente no plano de internacionalização. Desde que ele chegou, a receita da Iochpe Maxion triplicou e a participação da receita obtida no exterior saltou de 15% para 75%.
          Em 2014, Ivoncy deixa a presidência do Conselho de Administração, passando-a para seu filho Dan. Ivoncy faleceu em 22 de fevereiro de 2022, aos 82 anos.
          Negociada no Novo Mercado da Bolsa de Valores de São Paulo, a Iochpe é uma das poucas companhias brasileiras que se encaixam no perfil de corporação.
          Hoje a empresa atua em três divisões. A de rodas representa 80% da receita. O restante vem basicamente dos chamados componentes estruturais - que compõem as plataformas dos veículos. São partes, lembra Oliveira, que também sobreviverão à eletrificação dos carros. Em associação com a Amsted, o grupo tem, ainda, uma divisão ferroviária, que produz componentes para vagões de carga.
          Ao perceber a decisão do governo chinês para que todos os carros produzidos no país tenham rodas de alumínio, a Iochpe decidiu associar-se a uma das maiores montadoras locais, a Dongfeng, e investir também nesse segmento. No mundo, o grupo tem 31 fábricas, em 14 países, e 15 mil funcionários. Desse total, no Brasil há quatro fábricas e 6 mil empregados.
          Hoje, Europa e América do Norte representam as maiores fatias do faturamento - com 35% e em torno de 30%, respectivamente, da receita de R$ 9,6 bilhões em 2018. As operações na América do Sul, concentradas no Brasil, somam 25%.
          No fim de 2019, inaugura-se uma fábrica de rodas na Índia e, no fim de 2020, a segunda na China. Cada uma dessas fábricas tem capacidade para produzir mais de 2 milhões de rodas por ano. No caso da China, a Iochpe já tinha uma unidade de rodas de aço para caminhões.
(Fonte: revista Exame - 22.07.1992 / 22.05.1996 / 01.01.1997 / Capital Aberto - maio 2012 / jornal Valor - 11.07.2019 / OESP - 22.02.2022 - partes)

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