Total de visualizações de página

12 de set. de 2025

Tony's Chocolonely

          Era 2003 quando o jornalista holandês Teun van de Keuken decidiu se entregar à polícia, na frente das câmeras do programa que comandava, como cúmplice de trabalho infantil, trabalho escravo e desmatamento nas plantações de cacau da África Ocidental, por consumir chocolate com aquela matéria-prima.
          Para provar que dava para fabricar o produto indulgente de forma sustentável, ele e dois colegas de TV decidiram criar, em 2005, sua própria barra. O Tony’s Chocolonely ganhou esse nome porque Teun (ou Tony) considerava a causa solitária.
          Já um tanto conhecido na Europa e nos Estados Unidos, o chocolate Tony’s chegou sem alarde aos carrinhos de compras no Brasil em 2025. A barrinha que vem com statement surpreendeu até a matriz na demanda local: em São Paulo, onde a exclusividade é da Shopper, o estoque se esgotou em menos de um mês.
          A Tony's já acertou outros contratos de distribuição no país, onde espera ganhar o consumidor pelo sabor e pela consciência – uma história peculiar que já atraiu também investidores de peso.
          Para entrar no Brasil, a marca holandesa firmou acordos de importação com exclusividades locais, começando pelos supermercados Zona Sul, no Rio, no fim de maio, mas com primeiro carregamento já esgotado e um novo a caminho. Outros parceiros no país são a rede Verdemar, em Belo Horizonte, e, a partir de novembro, o Hiperideal, em Salvador, revelou a Tony's.
          “Dado o tamanho do país e a dinâmica única de distribuição, estamos adotando uma abordagem cuidadosa e passo a passo para expansão”, explica o executivo da Tony's, presente em 60 países.
          O negócio com apelo social e ambiental logo engrenou – mas os três fundadores, que nunca ocuparam cargos executivos na empresa, se desfizeram de suas participações já nos primeiros anos para voltar ao jornalismo. A idealista fábrica de chocolate tem atualmente como sócio majoritário o fundo Verlinvest, da família belga que compartilha o controle da AB InBev com Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Sicupira.
          Outro acionista de referência é a JamJar, dos fundadores da Innocent Drinks, que detém 5,6%. Em 2024, o ex-CEO da Starbucks, Howard Schultz, comprou 2% da companhia. Segundo a empresa, é a visão de longo prazo desses investidores que viabiliza o propósito do negócio. “Cumprir nossa missão exige crescimento e investimento. Quanto mais crescemos, mais grãos podemos comprar a preço de renda digna”, diz o gerente de exportação da Tony's, Rijk de Bie, ao Pipeline (Jornal Valor).
          Em sua produção, a Tony's exige que 100% dos grãos sejam rastreáveis, comprados acima do valor médio do mercado, fortalecendo os agricultores, e firmando contratos de longo prazo com cooperativas de cacau da Costa do Marfim e de Gana, que respondem por 60% da produção mundial e onde as desigualdades são maiores. O formato irregular do que seriam os quadradinhos da barra de chocolate simboliza justamente a divisão desigual de lucros no setor.
          Para uma proposta menos solitária, a Tony's convida outros fabricantes a adotarem os mesmos princípios, por meio do seu programa Tony’s Open Chain. Das marcas de consumo com ampla presença no Brasil, apenas Ben & Jerry’s, da Unilever, e Barry Callebaut são signatárias.
          Um efeito indireto do “chocolate com gosto de antigamente” – comentário recorrente nas redes da Shopper, atribuído à porcentagem de cacau e ausência de gordura hidrogenada – foi o aumento nas vendas de outras marcas com preocupação social, como a brasileira Dengo, na plataforma. “Não era esperado, não estava mapeado, mas significa que deu certo espalhar a causa do Tony”, diz o VP de marketing.
          Em 2024, as vendas somaram 200 milhões de euros, aproximadamente R$ 1,3 bilhão. Tomando como referência os múltiplos da Lindt, que compete pelo mesmo consumidor, o valor de mercado da Tony's passaria de R$ 8 bilhões – mas a companhia não tem capital aberto e nem planos de fazer IPO. Nenhuma transação envolvendo transferência de ações teve valor divulgado.
(Fonte: Valor - 11.09.2025)

Nenhum comentário: