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22 de jun. de 2021

Drycar

          Em 1987, num dos fins de semana em que o químico Lúcio Edno Pereira, nascido em 1962, procurava deixar seu Karmann Ghia um brinco, o síndico do prédio onde ele morava aplicou-lhe uma multa por lavar o bólido na garagem. Pereira ficou proibido de molhar o chão da garagem. Inconformado, jurou vingança. Na época, Pereira trabalhava no setor de tintas para carros da Autolatina e conhecia bem a composição química de cada cor, fosse pintura metálica, fosse fosca.
          Debruçou-se então, sobre tubos de ensaio num laboratório artesanal montado no quintal da casa de seus pais e, ali, passou a trabalhar na fórmula mágica. Levou três anos para chegar ao produto, mas finalmente pôde lavar seu Karmann Ghia sem um único pingo d'água.
          Pereira, evidentemente, não conta quais nem quantos ingredientes mistura no produto que ele batizou de Drycar (do inglês, carro seco). Diz apenas que a formulação fragmenta os minúsculos grãos de pó, areia ou qualquer tipo de sujeira. Assim, ao ser aplicado, com um simples pano, o produto não risca a pintura do automóvel. Bastam apenas 200 mililitros, o equivalente a um copo, para lavar e fazer brilhar o carro inteiro. "Eu não acreditava que tinha inventado alguma coisa", diz ele. "Nem me preocupei em patentear o produto." Que o Drycar era bom ele logo descobriu, ao ganhar como um dos primeiros clientes o síndico que o multara.
          Animado, saiu da Autolatina e passou a limpar carros em domicílio, formando uma clientela de políticos e artistas. Assim trabalhou por outros três anos. Certo dia, seu invento saiu nu jornal e ele foi procurado até por multinacionais interessadas em comprar-lhe a fórmula. "Fiquei apavorado", diz ele. "Sumi por três dias porque não sabia o que fazer." Só então Pereira bateu na porta de amigos para abrir uma sociedade, e tratou de patentear o produto (em setembro de 1994, o processo corria em 79 países).
          Houve muita discussão entre Pereira e seus três sócios até que o negócio saísse do papel. Eles analisaram vários canais de atuação e optaram por montar uma rede de franquias de lava-jato a seco. É certo que escolheram um caminho trabalhoso: Pereira poderia simplesmente vender a fórmula para encher-se de dinheiro. Um de seus sócios é Airton Baptista, até então vendedor de carros numa concessionária em São Paulo. Os outros dois sócios têm uma construtora e entraram com o dinheiro. Pereira e Baptista trabalharam, então, com várias hipóteses para montar uma empresa que, não fizesse água. Optaram pela franquia depois de estudar e reconhecer a inviabilidade de outras maneiras de levar o negócio em diante, como venda em supermercados, posto de gasolina, lava-rápidos tradicionais, etc.
          Descartadas essas hipóteses, sobravam ainda outras três: montaram-se lojas, um serviço de atendimento em domicílio e outro para ser feito dentro de concessionárias. Seu invento, previ Pereira, levari ainda um ou dois anos para ser copiado por algum concorrente. Seria tempo suficiente, segundo ele, para se estabelecer no mercado e garantir uma clientela fiel.
(Fonte: revista Exame - 14.09.1994)

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