A StarMedia foi fundada pelo uruguaio Fernando Espuelas, nascido em 1967 e formado em história pela Universidade de Connecticut. A empresa produziu um site em português e espanhol.
Em setembro de 1996, quando a StarMedia foi fundada, a preocupação era com a sobrevivência. Jack Chen, também nascido em em 1967, sócio de Espuelas na empresa é um ex-analista financeiro com diploma de ciência da computação e um MBA pela Universidade Harvard. Ele e Espuelas são amigos desde os dez anos. Sempre queriam montar um negócio juntos. Quando a ideia veio, Espuelas e Chen juntaram 100.000 dólares do próprio bolso para comprar mesas, cadeiras e computadores. Amontoaram tudo numa casa de propriedade dos pais de Chen em Riverside, no estado americano de Connecticut. O imóvel estava caindo aos pedaços. Espuelas e Chen se espremiam com mais uma dezena de funcionários em três cômodos no piso inferior da casa. Adriana Kampfner, nascida em 1973, vice-presidente de vendas globais da StarMedia, também dividia o espaço. Adriana, uma mexicana criada no estado americano de Michigan, largou um posto de analista no Chase Securities para pedir emprego a Espuelas. No andar de cima morava um pessoal que trabalhava em um restaurante chinês ao lado.
As coisa iam mal até que apareceu um anjo no caminho de Espuelas e Chen. Anjo é como é conhecido nos Estados Unidos o primeiro investidor a colocar dinheiro em uma empresa. O consultor de empresas de tecnologia da informação Gerardo Rosenkranz foi o anjo da StarMedia. Ele comprou um pacote de ações que passou a valer 31 milhões de dólares depois da abertura de capital. Espuelas e Chen correram também às casas de parentes e conhecidos tentando vender ações da StarMedia para levantar mais algum dinheiro. Não escapou nem o dentista de um funcionário, que comprou na época 40.000 ações a 50 centavos de dólar cada, que mais tarde passou a valer 2 milhões de dólares.
O escritório mambembe da StarMedia quase assustou investidores mais graúdos. "O que vim fazer aqui? Isso é ridículo", disse Frederick Wilson, da Flatiron, ao conhecer as precárias instalações da StarMedia. Mas seu sócio, Jerry Colona, disse que Espuelas fora bem recomendado e que deveriam ouvir o que ele tinha a dizer.
Para chegar ao eldorado de Wall Street, a StarMedia percorreu um caminho árduo. O conselho de administração se reuniu em janeiro de 1999 e decidiu que era hora de fazer a oferta pública inicial de ações da empresa (em inglês, inicial public offering ou IPO). Além do banco Goldman Sachs, como subscritor principal, a StarMedia escolheu mais três bancos como avalistas: o BancBoston Robertson Stephens, o J.P. Morgan e o Salomon Smith Barney. Steven Heller, diretor financeiro da StarMedia, um financista que fez carreira em empresas do Vale do Silício, foi um dos responsáveis na StarMedia pela oferta pública.
A empresa abriu seu capital na Nasdaq em 26 de maio de 1999. Lançou cada ação a 15 dólares. No final do dia, o preço chegou a 26 dólares, uma alta de 74%. A ação bateu nos 70 dólares no início de julho (1999), fazendo o valor de mercado da StarMedia atingir 3,7 bilhões de dólares. Um cifra assombrosa para quem faturou 5,3 milhões de dólares em 1998 e teve um prejuízo de 45,9 milhões.
Quer dizer: assombrosa no tradicional mundo das coisa concretas. No mundo virtual das empresas da Internet, aquela cifra era até banal.
A abertura de capital da StarMedia coincidiu com o estouro de uma guerra na Internet no Brasil. No final de junho de 1999, o grupo gaúcho RBS vendeu o controle do ZAZ para o grupo espanhol Telefónica. O Universo Online (UOL), pertencente aos grupos Abril e Folha, comprou o mecanismo da família Miner. O UOL tentava vender 10% de suas ações para levantar capital. A American Online, então maior provedor de acesso do mundo, e o Yahoo!, o site mais visitado da Internet, lançaram suas versões para o mercado brasileiro. Em abril (1999), a Microsoft lançou o site Microsoft Network em português. O SBT tinha o provedor de acesso SBT Online (SOL) e a Globo anunciava a criação de um
site nos moldes dos concorrentes.
Com o dinheiro que coletou, a StarMedia podia comprar outras empresas, recrutar os melhores profissionais do mercado e crescer, crescer, crescer. Ter sucesso em Wall Street era como conquistar o eldorado digital.
No mesmo ano de 1999, a StarMedia comprou a brasileira Cadê? por 5,3 milhões de dólares, numa das primeiras transações de porte da rede brasileira envolvendo empresa estrangeira. Pelo acordo com a StarMedia Fábio de Oliveira e seu sócio Gustavo Viberti ficariam um ano gerenciando o Cadê?
até ter o passe liberado em abril de 2000.
As avaliações eram reais? Nem os analistas que acompanhavam o desempenho das empresas ligadas à Internet sabiam. Eles leram em suas cartilhas que, para avaliar uma empresa, é preciso olhar a relação entre o preço na bolsa de valores e o lucro por ação. Como aplicar essa fórmula às empresas de Internet que têm lucros (e faturamento) baixos ou só prejuízos? Em 1997, a analista Lise Buyer, que trabalhava no T.Rowe Price, um superconservador grupo de fundos de investimento, deparou com esse problema quando resolveu se especializar em empresas de Internet. Ela ficou chocada ao saber que a métrica que comparava preço com lucro não funcionava na dimensão da Web. À luz dessa métrica, o valor das empresas on-line parecia simplesmente irracional. Lise, numa entrevista à revista Fortune, disse que só conseguiu entender o problema depois de ler o livro Security Analysis, um clássico escrito em 1934 pelos renomados investidores Benjamin Graham e David Dodd.
Está no livro: "Empresas inexperientes em novos setores de atividade não oferecem nenhuma base sólida para a determinação de seu valor intrínseco. O melhor que um analista pode fazer é classificar tais empresas como altamente especulativas e abandonar a tentativa de avaliá-las. O comprador de papeis como esse não está fazendo um investimento, mas apostando numa nova tecnologia, num novo mercado, num novo serviço. A aposta bem-sucedida em tais situações pode produzir altas recompensas, mas faz parte de um processo de apostas, e não de avaliação". Mais dia menos dia, o mercado teria, com certeza, de dar conta da discrepância entre o valor dessas empresas e seus resultados.
Por enquanto (julho de 1999), não importa muito se a empresa, como a StarMedia, teve prejuízo quase dez vezes superior à receita de 1998. "A única vez que um investidor mencionou nosso prejuízo foi para dizer que ele achou pequeno e questionar por que não estávamos investindo ainda mais dinheiro se o negócio era tão bom quanto estávamos falando", disse Espuelas, que comparou a Internet de então aos primeiros anos de utilização das ferrovias: "Naquela época, as ações valiam muito e as receitas eram relativamente baixas. Tudo o que os empresários faziam era colocar trilhos e comprar locomotivas. Ainda estamos colocando os trilhos, ainda estamos construindo a infraestrutura dessa indústria. O maior risco que corremos não é perder dinheiro. O maior risco é perdermos a oportunidade de liderar o mercado".
(Fonte: revista Exame - 28.07.1999 / Brasil em Exame - dezembro 1999 - Exame - 17.05.2000 - partes)