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1 de out. de 2011

Vespa

          A Piaggio, uma das maiores fabricantes italianas de aviões para a Segunda Guerra, havia sido bombardeada e estava praticamente falida. O empresário Enrico Piaggio decidiu, então, abandonar a aeronáutica e entrar na produção de veículos de massas, inspirado no modelo de Henry Ford: objetos utilitários e baratos que chegassem ao maior número de potenciais compradores em uma Itália arrasada economicamente. A Piaggio tinha milhares de pequenos motores estacionários, antes utilizados para dar partida nos aviões do exército, que estavam sem utilidade. Foi aí que Enrico teve aquele clique: vou criar uma moto.
          Em 1944, dois engenheiros já haviam criado um protótipo de uma moto com escudo protetor na dianteira, que ficou conhecida como Paperino, o apelido do Pato Donald na Itália. Mas Enrico não gostou do que viu. Decidiu contratar o engenheiro aeronáutico Corradino D’Ascanio para criar a primeira moto da Piaggio. Mas havia um problema: D’Ascanio, inventor do helicóptero coaxial, não gostava de motocicletas. Achava-as feias, desconfortáveis, difíceis de pilotar e sujas. Decidiu aplicar ao projeto seus conhecimentos de aerodinâmica. Cobriu todo o conjunto com uma carenagem para que a moto lembrasse um avião. Fixada apenas por uma bengala, a roda dianteira ficava solta pelo lado direito. Inspiração: o trem de pouso de aviões.
          Para reduzir o barulho do motor e a sujeira que o incomodava, o engenheiro aeronáutico colocou o motor junto da roda traseira. Era um pequeno motor de dois tempos, que levava a moto a 60 km/h, e tinha câmbio de três velocidades. Quando ouviu o barulho do motor, Enrico Piaggio teria exclamado: “Sembra una vespa!” [parece uma vespa]. Foi com esse nome que o scooter teve sua patente registrada em 1946. Chegou ao mercado no mesmo ano, com motor monocilíndrico de 98 cc e cerca de 3,0 cv de potência.
          A primeira Vespa, batizada de MP6 (o sexto protótipo de uma Moto Piaggio), foi apresentada na primavera de 1946, no Golf Club de Roma. Naquele mesmo ano, a Vespa foi lançada no Salão de Motos de Milão, evento realizado até os dias atuais, e teve todas as unidades vendidas. Ainda naquele ano, a Piaggio colocou no mercado 2.484 scooters, produzidos na planta de Pontedera. Esse número virou 10.535 no ano seguinte. A Vespa fez um sucesso instantâneo na Itália arrasada pela guerra. Afinal, era acessível e econômica. Perfeita para o momento que o país atravessava.
          A Vespa Colocou os pés nas produção de automóveis ao apresentar um dos menores carros do mercado europeu em um evento de gala em Mônaco. Era o modelo Vespa 400, que competia na mesma arena de pulgas como o Goggomobil e o Fiat 500, que chegaram ao mercado apenas alguns meses antes do carrinho da Vespa, que chegou em 1957. O 400, uma menção ao tamanho do motor que o equipava, de 393 cm³, era fabricado na França. A Vespa nunca mais fabricou outro automóvel em sua história.
          A Vespa contribuiu para que a Piaggio se tornasse uma das maiores fabricantes de motocicletas do mundo, líder no segmento de duas rodas na Europa. Controlado pela holding italiana Immsi, o grupo detém hoje, além da Vespa, as marcas Aprilia, Derbi, Gilera e Moto Guzzi e também vende scooters com o nome Piaggio.
          Em 2020, o Grupo Piaggio reforçou a liderança no mercado europeu de veículos de duas rodas, com 14,2% de market share e mais de 200 mil unidades vendidas. O bom resultado foi fruto do crescimento significativo nas vendas de motocicletas e do excelente desempenho no segmento de scooters, onde a participação do grupo foi de 24%.
          A história da Vespa se confunde com clássicos do cinema. O scooter virou símbolo cult e ganhou notoriedade mundial quando Gregory Peck levou Audrey Hepburn para um passeio de Vespa pelo trânsito da capital italiana nas célebres cenas de “A Princesa e o Plebeu” (Roman Holiday, 1953).
          Mas foram Marcello Mastroianni e Federico Fellini que criaram o mito, no filme “La Dolce Vita” (1960), e fizeram da Vespa um símbolo da cultura juvenil e rebelde naquela década. Até Salvador Dalí quis “surrealizar” a Vespa de dois jovens que conheceu em Cadaqués, em 1962. O exemplar, pintado e assinado pelo mestre do surrealismo, está no museu da Piaggio em Pontedera, Itália.
          Até hoje, a Vespa mais cara do mundo foi arrematada por cerca de US$ 196 mil em leilão em 2017. Conhecida como “número 3”, o modelo era integrante da “série 0” (zero), uma espécie de pré-série com apenas 60 unidades fabricada pela Piaggio em 1946 de forma praticamente artesanal, antes do lançamento oficial. Com motor de 98 cc e câmbio de três marchas, a “Número 3”, como é conhecida, tem as soldas feitas à mão e as partes de aço da estrutura moldadas em formas de madeira.        
          A Piaggio vendeu mais de 532 mil modelos de duas rodas em 2016 usando diversas marcas, que incluem Aprilia e Moto Guzzi.
(Fonte: Autocar Brasil - msn - 20.02.2019 / Forbes edição 86 - abril/2021) 

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