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4 de out. de 2011

Quattor

          Num setor (petroquímico) dominado por empresas como Suzano e Braskem, a Unipar era vista como uma espécie de "patinho feio", um grupo menos vistoso que os outros, cheio de problemas de gestão e dominado por uma família instável e difícil de fazer negócios. O patinho feio, em 2007, teria sua chance de virar cisne. A partir de novembro de 2007, a Unipar seria a sócia majoritária de um empreendimento em parceria com a Petrobras, a Companhia Petroquímica do Sudeste - um colosso com receita de 8 bilhões de reais e principal produtor de matéria-prima para plásticos e resinas na região mais desenvolvida do país.
          Tudo aconteceu meio que por acaso. Depois de comprar a Suzano Petroquímica, em agosto de 2007, a Petrobras precisava de uma sócia privada para a nova empresa (uma maneira de livrar-se das insinuações de estatismo e das sanções dos órgãos de defesa da concorrência). Como a Petrobras já era sócia da Odebrecht na Braskem, a única empresa livre para uma nova parceria era a Unipar.       
          A nova empresa petroquímica, a Quattor (então ainda chamada de Companhia Petroquímica do Sudeste), foi criada em novembro de 2007 pela Petrobras e a Unipar através da união de ativos de cinco empresas diferentes. O único ativo que a Unipar, comandada por Frank Geyer Abubakir, não juntou com a Quattor foi a Carbocloro, uma joint venture com uma companhia americana.
          Em junho de 2008, a empresa foi rebatizada, passou a se chamar Quattor ("quatro", na origem latina), para se descolar da imagem de empresa sem marca forte e tentar se diferenciar da concorrente Braskem, braço do grupo Odebrecht e líder desse mercado. O processo de criação da nova marca durou quatro meses, envolveu dez publicitários e custou 6 milhões de reais, incluindo anúncios que apresentavam a empresa ao mercado.
          Os executivos da companhia recém-criada deram apenas duas diretrizes para nortear a criação da marca. A primeira era fugir de uma espécie de padrão cristalizado no setor pelo qual os nomes das empresas fazem referência direta às palavras "química" e "petroquímica" e, invariavelmente, eram apresentadas na forma de sigla. É o caso da iraniana National Petrochemical Company, ou NPC, e da chinesa Shanghai Petrochemical Company, SPC, duas grandes empresa oriundas de países emergentes. O veto incluía ainda soluções híbridas, como a adotada pela Braskem, Bras de Brasil e kem de kemic ou kemikəl, química em grego. "Queríamos deixar para trás a ideia de que éramos um conglomerado de empresas antigas e criar uma companhia completamente nova", disse Vitor Mallmann, presidente da Quattor.
          A segunda diretriz estava ligada às pretensões globais da nova companhia: sua marca deveria ser facilmente entendida e pronunciada em várias línguas.
          A primeira etapa do processo de batismo da Quattor exigiu dos publicitários um mergulho nas particularidades da petroquímica para encontrar termos que sintetizassem a atividade. "A ideia era estudar a petroquímica desde suas origens até a maneira como as empresas se apresentavam à opinião pública", disse Aaron Sutton, sócio e diretor de criação da agência de publicidade MPM, responsável pela estratégia de criação da marca. O resultado foi uma lista de 150 sugestões, das quais três nomes se tornaram finalistas no processo - Quattor, Totum e Kymia, adaptações de termos latinos e gregos. A escolha pelas duas línguas clássicas levou em conta a facilidade com que os termos são reconhecidos e pronunciados praticamente da mesma forma em vários países.
          Para apresentar aos executivos os finalistas, os publicitários produziram fac-símiles de páginas de jornais com reportagens trazendo os três nomes. O mesmo foi feito com reportagens de TV. Assim, foi possível uma percepção clara da marca em uso.
          Na criação de um nome para a empresa, no entanto, não se leva em conta apenas a sonoridade de pronúncia. A escolha por Quattor deu-se principalmente pelo fato de ser possível agregar à palavra de origem latina ideias positivas, como a preocupação ambiental. "O número 4, nesse caso, remete aos elementos da natureza, terra, ar, fogo e água, que eram a base dos estudos dos antigos alquimistas", disse Sutton. Foi justamente a preocupação com a natureza que permeou a primeira campanha de TV da empresa.
          Em agosto de 2008, depois de tudo definido, chegou a vez de estampar a boa nova em revistas:
"QUATTOR SIGNIFICA QUATRO. DOS 4 CANTOS DO BRASIL PARA OS 4 CANTOS DO MUNDO. Quattor é a grande inovação da petroquímica brasileira que já nasce com vocação internacional. Hoje, ela tem em sua base no Sudeste, perto dos principais pólos produtores e consumidores, mas o seu mercado não tem limites. Os planos de crescimento são arrojados e o que não falta é infra-estrutura, plantas modernas e complementares, diversidade tecnológica e recursos para alcançar os mais ousados objetivos. O progresso e o desenvolvimento do Brasil passam por aqui. A Quattor Petroquímica é resultado da união da Unipar e da Petrobras. A sinergia criada através da fusão das suas empresas - Petroquímica União, Polietilenos União, Unipar - Divisão Química, Rio Polímeros e Suzano Petroquímica - criou um portfólio completo para atender a todos os mercados. E mais uma coisa que diferencia a Quattor Petroquímica: seu comprometimento com os clientes. Todo o trabalho é desenvolvido em parceria. É assim que a Quattor vai criar um novo horizonte para a petroquímica no Brasil."
          Pouco mais de dois anos depois dessa trabalheira toda para a escolha do nome, porém, a  Quattor evaporou. Se foi criada para ser uma segunda força petroquímica, a Petrobras esqueceu disso. A Quattor, então pertencente à Unipar e Petrobras, foi vendida no início de 2010 para a Braskem, então dona de polos no nordeste e no sul, de quem a Petrobras é a segunda maior acionista, com 36% do capital. O negócio foi de  R$ 870 milhões.
          Um pelotão de publicitários, a diretoria exigente por nome de reconhecimento planetário, 6 milhões de reais investidos, 150 nomes pré-selecionados, três finalistas, dicionários de latim e grego a postos, quatro meses de trabalho. Provavelmente, numa enquete, dez entre dez entrevistados responderiam que nunca ouviram falar em "Quattor". A pergunta de 6 milhões de reais é: esse pessoal todo não ficou frustrado?
          Se houve frustração, talvez nem a repórter da revista Exame, Melina Costa, que tanto se dedicou para escrever o texto, saiba. Não se tem notícia. Mas, a verdade é que o "quatro" em latim não existe mais como marca, durou pouco mais de dois anos.
          Com a compra da Quattor pela Braskem, é finalizada a consolidação do setor petroquímico brasileiro. A ideia dos três polos petroquímicos regionais, Copene - Companhia Petroquímica do Nordeste, Copesul - Companhia Petroquímica do Sul e Companhia Petroquímica do Sudeste, que durante décadas foi idealizada, foi completamente sepultada.
          A Braskem, a responsável pela consolidação, mesmo tendo se expandido, especialmente no México, parece não ter ficado tão grande assim. A holandesa LyondellBasell, pelo menos desde meados de 2018, estaria com o talão de cheques aberto para comprar a multinacional brasileira. A  Odebrecht estaria interessada na venda, com o objetivo de reduzir sua dívida. Mas foi justamente o nome Odebrecht, tão chamuscado, que espantou os holandeses, pelo menos por enquanto. Falta fechar com a Petrobras, que também precisa vender ativos.
          Em delação à Operação Lava-Jato, em 2017, o presidente da Braskem na época, Carlos Fadigas, afirmou que houve direcionamento relevante de recursos “por fora” para aquisição da Quattor, de cerca de R$ 150 milhões.
(Fonte: revista Exame - 27.08.2008 - parte)
(Fonte: revista Exame - 

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