O banco Bear Stearns foi fundado em 1923, em Nova York, como uma pequena corretora de ações, com capital de US$ 500 mil, por Joseph Bear, Robert Stearns e Harold Mayer. Já em seus primeiros anos de existência se deparou com a grande crise de 1929, mas passou incólume e apesar do crash de Wall Street, a corretora consegue atravessar a crise sem demitir nenhum empregado. Em 1933, a corretora cria o departamento de títulos públicos e contrata Salim L. Lewis, da corretora Salomon Brothers para dirigi-lo. Em seguida, abre sua primeira filial em Chicago. O prestígio de Lewis cresce e, em 1938, torna-se sócio depois de multiplicar o lucro ao investir em papéis de ferrovias e de outras empresas de infraestrutura.
A autorização para operar também como banco de investimento é conseguida em 1943. O banco cresce com a intermediação de fusões e aquisições de ferrovias, muitas das quais passavam por dificuldades em razão do crescimento da indústria automotiva e da aviação. Em 1955 é feita a abertura do primeiro escritório no exterior, em Amsterdã. Nos anos seguintes viriam vária filiais, incluindo Genebra, Paris, Londres, Tóquio e São Paulo. Por volta de 1965 já está concretizada a expansão nos negócios no varejo e abertura de escritórios em grandes cidades dos EUA, bem como a ampliação dos negócios na área de gestão de grandes fortunas, depois usada como base para operações de aluguel de papéis a grandes especuladores.
Em 1975, com a cidade de Nova York à beira da falência, poucos queriam comprar seus papéis. O grupo aposta US$ 10 milhões nos títulos do município. Alguns anos depois, tem grande lucro com a operação. Em 1978, com a morte de Lewis, que fez do banco uma potência, entra em seu lugar Alan C. Greenberg, que começou na empresa como escriturário em 1949 e se tornou um ás na mesa de operações. Em oito anos ele quadruplicou o capital do grupo.
O crash da Bolsa de 1987 atinge fortemente a companhia, mas, com a retomada da economia, se recupera e volta a crescer. Acusado de fraudes como agente de compensação da corretora A.R. Baron, em 1999, o Bear Stearns concorda em pagar US$ 42 milhões em indenizações a clientes.
O início do caminho para a bancarrota passa a ser delineado em 2000 quando o banco começa a apostar em operações com lastro em hipotecas, para repassar para a clientela. Mas, períodos de ostentação ainda estavam por vir. Em 2002, o banco deixa seu tradicional endereço em Wall Street e instala sua sede numa torre de 47 andares, em formato octogonal, na Madison Avenue, região nobre de Nova York, com valor estimado de US$ 1,5 bilhão. Em 2005, o Bear Stearns é incluído na lista das instituições financeiras mais admiradas dos EUA pela revista Fortune e mantém o posto nos dois anos seguintes.
Em 2007, o banco faz provisões bilionárias para cobrir perdas com operações lastreadas em hipotecas e registra o primeiro prejuízo. A agência Standard & Poor's rebaixa sua nota de crédito. O Bear Stearns dá garantias para um empréstimo de US$ 3,2 bilhões para viabilizar a liquidação de dois fundos hedge com títulos tóxicos. No dia 8 de janeiro de 2008, Alan Schwartz assume a presidência executiva no lugar de James Cayne que permanece à frente do conselho.
É quase inacreditável que o Bear Stearns carregasse ativos equivalentes a 35 vezes o seu patrimônio, quando o limite global para os bancos comerciais é 8, e que isso fosse negociado diariamente no overnight. É quase inacreditável também que o banco não se desse conta do perigo de concentrar boa parte de seus negócios em operações com lastro em hipotecas de altíssimo risco.
Numa semana devastadora, entre 10 e 17 de março de 2008, o imponente Bear Stearns ruiu. O preço de suas ações despencou e o banco teve que ser vendido às pressas para o JP Morgan Chase, (vide origem da marca JP Morgan neste blog) sob pressão das autoridades americanas.
Na Segunda-feira, 10 de março, a crise financeira ganha contornos dramáticos. Os saques de clientes se multiplicam e o crédito interbancário desaparece. O banco tem de usar as próprias reservas, de US$ 18 bilhões, para conseguir fechar as contas diárias. Suas ações, que chegaram a valer US$ 170 antes da crise, fecharam a US$ 62, com queda de 11% no dia.
Na terça-feira, 11 de março, o Fed (Banco Central americano) abre um crédito de US$ 200 bilhões para socorrer bancos de investimentos e corretoras em dificuldades. O atual secretário do tesouro, Tim Geithner, então à frente da sucursal do Fed em Nova York, e Ben Bernanke, presidente do Fed, almoçam com banqueiros. Os principais executivos de Bear Stearns não foram. As ações fecham a US$ 62,97.
Na quarta-feira, dia 12 de março, o presidente do banco, Alan Schwartz, dá uma entrevista à rede CNBC e nega a existência de problemas de liquidez. Os principais executivos do Bear Stearns discutem saídas para a crise com consultores da Lazard Frères, banco de negócios contratado para ajudar em sua venda ou na busca de mais capital. As ações fecham em US$ 61,58.
Na quinta-feira, dia 13 de março, ficou notório que a entrevista de Schwartz, em vez de acalmar o mercado, aumentou a desconfiança com relação ao banco. Os US$ 18 bilhões que o Bear Stearns tinha em caixa evaporam rapidamente. O saldo cai para US$ 2 bilhões. Schwartz liga para Jamie Dimon, presidente do JP Morgan Chase, para pedir ajuda, mas ele nada promete. O Fed anuncia uma nova linha de crédito, no valor de R$ 13 bilhões e prazo de 28 dias, para ser repassado ao banco JP Morgan. As ações fecham a US$ 57.
Na sexta-feira, dia 14 de março, contrariando as expectativas das autoridades e dos executivos do Bear Stearns, os investidores reagem negativamente à nova linha de crédito do Fed. As ações fecham a US$ 30, com queda de quase 50% no dia. Bernanke e Henry Paulson Jr, então secretário do tesouro, percebem que não há mais salvação para o banco e dizem a Schwartz que ele terá que vendê-lo até domingo à noite, antes da abertura do mercado na Ásia. Avisam também que a linha de crédito, que seria de 28 dias, não estará mais disponível na segunda-feira.
No sábado, 15 de março, diante da urgência do negócio, o Bear Stearns desiste de procurar outros compradores e passa a se concentrar na venda para o JP Morgan, o único com cacife para fechar a transação no fim de semana. Centenas de executivos dos dois bancos e consultores independentes varam a madrugada dando uma blitz nos livros do banco em dificuldade.
No domingo, dia 16 de março, o Bear Stearns assina um acordo de venda com o JP Morgan Chase por US$ 2 a ação, no total de US$ 236 milhões, menos de 10% do valor de mercado da época. O Fed anuncia a concessão de um crédito de US$ 30 bilhões para o JP Morgan absorver os ativos tóxicos do Bear Stearns.
Na segunda-feira, dia 17 de março, os mercados abrem sob o impacto da notícia da venda do Bear Stearns para o JP Morgan. As ações de Bear Stearns caem quase 90% e fecham em US$ 2,86. Alguém cola uma nota de US$ 2 na porta de vidro do edifício sede do banco, em Nova York.
Na segunda-feira seguinte, dia 24 de março (2008), sob pressão dos acionistas, que ameaçavam ir à Justiça, o JP Morgan eleva a oferta inicial para US$ 10 a ação, num totoal de US$ 1,1 bilhão, menos que o valor estimado só para a sede do Bear Stearns. Os controladores do banco aprovam o acordo em 29 de maio. Em 2 de junho suas ações deixam de ser negociadas em Wall Street. É o fim de uma história de 85 anos.
Como se veria depois, a quebra do Bear Stearns foi uma espécie de avant-première da crise financeira de proporções globais que acabou estourando em setembro do mesmo ano de 2008, com a falência do Lehman Brothers (vide origem da marca Lehman Brothers neste blog), outro ícone do mercado financeiro americano.
(Fonte: revista Época - 01.06.2009 - parte)
A autorização para operar também como banco de investimento é conseguida em 1943. O banco cresce com a intermediação de fusões e aquisições de ferrovias, muitas das quais passavam por dificuldades em razão do crescimento da indústria automotiva e da aviação. Em 1955 é feita a abertura do primeiro escritório no exterior, em Amsterdã. Nos anos seguintes viriam vária filiais, incluindo Genebra, Paris, Londres, Tóquio e São Paulo. Por volta de 1965 já está concretizada a expansão nos negócios no varejo e abertura de escritórios em grandes cidades dos EUA, bem como a ampliação dos negócios na área de gestão de grandes fortunas, depois usada como base para operações de aluguel de papéis a grandes especuladores.
Em 1975, com a cidade de Nova York à beira da falência, poucos queriam comprar seus papéis. O grupo aposta US$ 10 milhões nos títulos do município. Alguns anos depois, tem grande lucro com a operação. Em 1978, com a morte de Lewis, que fez do banco uma potência, entra em seu lugar Alan C. Greenberg, que começou na empresa como escriturário em 1949 e se tornou um ás na mesa de operações. Em oito anos ele quadruplicou o capital do grupo.
O crash da Bolsa de 1987 atinge fortemente a companhia, mas, com a retomada da economia, se recupera e volta a crescer. Acusado de fraudes como agente de compensação da corretora A.R. Baron, em 1999, o Bear Stearns concorda em pagar US$ 42 milhões em indenizações a clientes.
O início do caminho para a bancarrota passa a ser delineado em 2000 quando o banco começa a apostar em operações com lastro em hipotecas, para repassar para a clientela. Mas, períodos de ostentação ainda estavam por vir. Em 2002, o banco deixa seu tradicional endereço em Wall Street e instala sua sede numa torre de 47 andares, em formato octogonal, na Madison Avenue, região nobre de Nova York, com valor estimado de US$ 1,5 bilhão. Em 2005, o Bear Stearns é incluído na lista das instituições financeiras mais admiradas dos EUA pela revista Fortune e mantém o posto nos dois anos seguintes.
Em 2007, o banco faz provisões bilionárias para cobrir perdas com operações lastreadas em hipotecas e registra o primeiro prejuízo. A agência Standard & Poor's rebaixa sua nota de crédito. O Bear Stearns dá garantias para um empréstimo de US$ 3,2 bilhões para viabilizar a liquidação de dois fundos hedge com títulos tóxicos. No dia 8 de janeiro de 2008, Alan Schwartz assume a presidência executiva no lugar de James Cayne que permanece à frente do conselho.
É quase inacreditável que o Bear Stearns carregasse ativos equivalentes a 35 vezes o seu patrimônio, quando o limite global para os bancos comerciais é 8, e que isso fosse negociado diariamente no overnight. É quase inacreditável também que o banco não se desse conta do perigo de concentrar boa parte de seus negócios em operações com lastro em hipotecas de altíssimo risco.
Numa semana devastadora, entre 10 e 17 de março de 2008, o imponente Bear Stearns ruiu. O preço de suas ações despencou e o banco teve que ser vendido às pressas para o JP Morgan Chase, (vide origem da marca JP Morgan neste blog) sob pressão das autoridades americanas.
Na Segunda-feira, 10 de março, a crise financeira ganha contornos dramáticos. Os saques de clientes se multiplicam e o crédito interbancário desaparece. O banco tem de usar as próprias reservas, de US$ 18 bilhões, para conseguir fechar as contas diárias. Suas ações, que chegaram a valer US$ 170 antes da crise, fecharam a US$ 62, com queda de 11% no dia.
Na terça-feira, 11 de março, o Fed (Banco Central americano) abre um crédito de US$ 200 bilhões para socorrer bancos de investimentos e corretoras em dificuldades. O atual secretário do tesouro, Tim Geithner, então à frente da sucursal do Fed em Nova York, e Ben Bernanke, presidente do Fed, almoçam com banqueiros. Os principais executivos de Bear Stearns não foram. As ações fecham a US$ 62,97.
Na quarta-feira, dia 12 de março, o presidente do banco, Alan Schwartz, dá uma entrevista à rede CNBC e nega a existência de problemas de liquidez. Os principais executivos do Bear Stearns discutem saídas para a crise com consultores da Lazard Frères, banco de negócios contratado para ajudar em sua venda ou na busca de mais capital. As ações fecham em US$ 61,58.
Na quinta-feira, dia 13 de março, ficou notório que a entrevista de Schwartz, em vez de acalmar o mercado, aumentou a desconfiança com relação ao banco. Os US$ 18 bilhões que o Bear Stearns tinha em caixa evaporam rapidamente. O saldo cai para US$ 2 bilhões. Schwartz liga para Jamie Dimon, presidente do JP Morgan Chase, para pedir ajuda, mas ele nada promete. O Fed anuncia uma nova linha de crédito, no valor de R$ 13 bilhões e prazo de 28 dias, para ser repassado ao banco JP Morgan. As ações fecham a US$ 57.
Na sexta-feira, dia 14 de março, contrariando as expectativas das autoridades e dos executivos do Bear Stearns, os investidores reagem negativamente à nova linha de crédito do Fed. As ações fecham a US$ 30, com queda de quase 50% no dia. Bernanke e Henry Paulson Jr, então secretário do tesouro, percebem que não há mais salvação para o banco e dizem a Schwartz que ele terá que vendê-lo até domingo à noite, antes da abertura do mercado na Ásia. Avisam também que a linha de crédito, que seria de 28 dias, não estará mais disponível na segunda-feira.
No sábado, 15 de março, diante da urgência do negócio, o Bear Stearns desiste de procurar outros compradores e passa a se concentrar na venda para o JP Morgan, o único com cacife para fechar a transação no fim de semana. Centenas de executivos dos dois bancos e consultores independentes varam a madrugada dando uma blitz nos livros do banco em dificuldade.
No domingo, dia 16 de março, o Bear Stearns assina um acordo de venda com o JP Morgan Chase por US$ 2 a ação, no total de US$ 236 milhões, menos de 10% do valor de mercado da época. O Fed anuncia a concessão de um crédito de US$ 30 bilhões para o JP Morgan absorver os ativos tóxicos do Bear Stearns.
Na segunda-feira, dia 17 de março, os mercados abrem sob o impacto da notícia da venda do Bear Stearns para o JP Morgan. As ações de Bear Stearns caem quase 90% e fecham em US$ 2,86. Alguém cola uma nota de US$ 2 na porta de vidro do edifício sede do banco, em Nova York.
Na segunda-feira seguinte, dia 24 de março (2008), sob pressão dos acionistas, que ameaçavam ir à Justiça, o JP Morgan eleva a oferta inicial para US$ 10 a ação, num totoal de US$ 1,1 bilhão, menos que o valor estimado só para a sede do Bear Stearns. Os controladores do banco aprovam o acordo em 29 de maio. Em 2 de junho suas ações deixam de ser negociadas em Wall Street. É o fim de uma história de 85 anos.
Como se veria depois, a quebra do Bear Stearns foi uma espécie de avant-première da crise financeira de proporções globais que acabou estourando em setembro do mesmo ano de 2008, com a falência do Lehman Brothers (vide origem da marca Lehman Brothers neste blog), outro ícone do mercado financeiro americano.
(Fonte: revista Época - 01.06.2009 - parte)
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